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Dimensionamento de Viga “T” na prática

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Dimensionamento de Viga “T” na prática

Quando tratamos de dimensionamento de viga em arranjos estruturais de concreto armado, podemos dizer que as lajes e as vigas não são elementos independentes. Estes elementos trabalham em conjunto, por esse motivo o dimensionamento de vigas na maioria dos casos em estruturas usuais de concreto armado pode ser realizado considerando formato de seção T.

Se você quer entender o que é uma viga T, como ela funciona estruturalmente, quais são as recomendações normativas, além de acompanhar na pratica um dimensionamento completo de viga seção T, leia este artigo até o final.

O que é e como funciona uma viga “T”?

Em uma estrutura de concreto armado, a laje pode ser moldada de forma monolítica com as vigas. Nesse caso, uma largura especifica da laje é considerada como parte integrante da viga, e com isso forma a chamada seção T. Apesar de não serem tão comuns quanto a utilização de seção retangular, as vigas T são grandemente empregadas em pontes, elementos pré-moldados e em estruturas de concreto armado de edifícios usuais com vigas e lajes maciças.

Em uma viga de seção T, a parte vertical da seção é chamada de alma (ou nervura), e a parte horizontal é chamada de mesa, a qual normalmente é representada pela largura colaborante da laje, como vimos anteriormente. Veja a seguir a representação de uma típica viga seção T:

Termos e nomenclaturas importantes para o dimensionamento de viga

Da seção acima, observam-se as seguintes nomenclaturas de importante compreensão. Levar em consideração que o que possui a letra f remete à mesa, visto que a nomenclatura dessa parte em inglês é flange, enquanto que as nervuras levam o w da palavra web que remete às nervuras ou almas em questão.

bw = Largura da nervura;

bf = Largura da mesa;

h = Altura total da seção;

hf = espessura da mesa;

d = altura útil da seção;

As = área da armadura tracionada;

A’s = Área da armadura comprimida;

d’ = distância do centroide de A’s até a borda mais comprimida da seção.

Considerações gerais para dimensionamento de viga “T”

Podemos dizer que a seção só funcionará como T realmente quando o momento fletor solicitante for positivo. Em caso de momento fletor negativo, o dimensionamento se dá por meio de seção retangular convencional com base bw e altura h, pois nesse caso a mesa se torna um elemento tracionado.

Além disso, para a seção T ser verdadeira no momento fletor positivo, devemos atentar para a posição da linha neutra. No caso onde a linha neutra passe cortando a alma, será considerada uma seção T verdadeira. Por outro lado, se a linha neutra passar cortando a mesa, o dimensionamento se dará por seção transversal retangular de base bf e altura h. Isso se dá pelo fato de que abaixo da seção comprimida desconsideramos qualquer resistência a tração que o concreto possa oferecer.

Em situações de seção T verdadeira, não é toda largura da laje que colabora com o elemento estrutural da viga. Para realizarmos o dimensionamento, é muito importante definir com precisão qual é a largura da laje que colabora com a viga. Isso irá garantir que as distribuições de esforços internos, tensões, deformações e deslocamentos na estrutura, sejam estabelecidos de uma forma mais realista.

Para tal, o item 14.6.2.2 da ABNT NBR 6118:2014 apresenta uma condição simplificada para determinação da largura colaborante de lajes em vigas:

Perceba que a norma trata o valor de a como distância entre pontos de momento fletor nulo, mas mantem essa distância em função do vão teórico l do tramo considerado.

Introdução ao Exercício de dimensionamento de viga “T”

Vamos dissecar a determinação da geometria da V04 da estrutura apresentada abaixo:

Lembrando que vamos utilizar a simplificação da NBR6118:2014 apresentada anteriormente.

A primeira etapa consiste em determinar o valor de a da nossa peça, como no modelo estrutural ela apoia sobre os pilares P02 e P05 (distanciados pelos eixos em 675cm), idealmente deve-se construir um modelo estrutural da viga para ser analisado a distância entre os momentos nulos.

Percebe-se que o valor de a a ser adotado pode ser o de 449.8, ou usar a simplificação da norma de 0,6*675cm que será de 405cm. A NBR6118:2014 nos permite adotar tanto um quanto outro valor, cabe a nós decidir. Aqui vamos usar os dois valores a título de comparação.

GEOMETRIA DADA PELA ANÁLISE DO PÓRTICO (a = 449,8cm)

A largura da mesa é dada pela seguinte equação: 𝑏𝑓=𝑏𝑤+𝑏1+𝑏3 quando em vigas de seção T com parte da laje em balanço. Como nossa viga em questão é uma viga central, sem ter balanços nas lajes, podemos usar 𝑏𝑓=𝑏𝑤+(2×𝑏1)

O valor de b1 é o menor dos valores entre 0,1a e 0,5b2

O valor de b2 é determinado pela distância entre as faces internas das almas (nesse caso as próprias vigas), como pode-se perceber na planta de fôrmas esse valor é de 475cm.

Tem-se então:

0,1 ×449,8≅45𝑐 𝑚

 𝑏1 ≤

0,5 ×475=237,5𝑐𝑚

Adota-se o menor dos dois valores e obtém-se a seguinte geometria:

GEOMETRIA DADA PELA SIMPLIFICAÇÃO DA NBR6118:2014 (a=405cm)

Têm-se:

0,1 ×405≅40𝑐𝑚

𝑏1≤

0,5 ×475=237,5𝑐𝑚

E a geometria:

Percebe-se que a diferença neste caso é mínima, portanto usar os valores dados pela simplificação da NBR6118:2014 é uma alternativa prática de resultado imediato, podendo-se deixar a análise de diagramas para situações mais críticas ou sensíveis ao cálculo (extremos de deformações ou alto controle financeiro por exemplo).

ROTEIRO DE CÁLCULO PARA DIMENSIONAMENTO DE VIGA – ARMADURA DE FLEXÃO.

Será aqui apresentado o roteiro de cálculo de seções T proposto por Araújo (2014), porém os princípios de dimensionamento são idênticos aos de seções retangulares, onde as seções planas permanecem planas após a deformação, as tensões de tração são absorvidas apenas pelo aço e a compressão, pelo concreto. Caso as tensões de compressão sejam maiores que as tensões resistentes do concreto, o mesmo recebe armadura de compressão.

Araújo propôs valores adimensionais em tabelas para auxiliar ao dimensionamento destas seções, que serão apresentados logo após o roteiro.

PARÂMETROS PARA DIMENSIONAMENTO DE VIGA T

αc = 0,85; se Fck ≤50Mpa

αc = 0,85[1−(𝐹𝑐𝑘−50)200]; se Fck >50Mpa

Fcd = 𝐹𝑐𝑘/𝛾𝑐; 𝑆𝑒𝑛𝑑𝑜 𝛾𝑐=1,4 𝑒𝑚 𝑔𝑒𝑟𝑎𝑙

σcd =αc×Fcd

Fyd= 𝐹𝑦𝑘/𝛾𝑠; 𝑠𝑒𝑛𝑑𝑜 𝛾𝑠=1,15 𝑒𝑚 𝑔𝑒𝑟𝑎𝑙

λ= 0,8; 𝑠𝑒 𝐹𝑐𝑘 ≤50𝑀𝑃𝑎

λ= 0,8− (𝐹𝑐𝑘−50)400; 𝑠𝑒 𝐹𝑐𝑘>50𝑀𝑃𝑎

βf= ℎ𝑓/𝑑; βw= 𝑏𝑤/𝑏𝑓;

ξlim = 0,45; 𝑠𝑒 𝑓𝑐𝑘 ≤35𝑀𝑃𝑎

ξlim = 0,35; 𝑠𝑒 𝑓𝑐𝑘 >35 𝑀𝑝𝑎

se βf > λ × ξlim; Viga de seção retangular, de largura 𝑏𝑓 e altura útil 𝑑.

A verificação acima deve ser feito no início do processo de cálculo para determinar o roteiro a ser seguido. Caso a condição βf > λ×ξlim seja verificada, isso significa que a linha neutra cruza apenas a mesa, devendo ser calculada com o roteiro de seção retangular.

MOMENTO REDUZIDO E MOMENTO LIMITE

Nesta etapa entram as tabelas adimensionais cujos valores de entrada e saída auxiliam no cálculo mais adiante. Os valores de 𝑟𝑐𝑐𝑙𝑖𝑚 são utilizados apenas em situações de armadura dupla.

dimensionamento-viga-t
dimensionamento-viga-t

DIMENSIONAMENTO DE ARMADURA SIMPLES (𝝁≤𝝁𝐥𝐢𝐦)

DIMENSIONAMENTO DE ARMADURA DUPLA (𝝁>𝝁𝐥𝐢𝐦)

armadura-compressão

EXEMPLO PRÁTICO DIMENSIONAMENTO DE VIGA

Vamos supor que a V04 apresentada no exemplo anterior tenha um carregamento total de 20kN/m resultando no diagrama a seguir:

porticos-vigas

E a seção transversal da peça seja determinada da seguinte forma (conforme exemplos anteriores): Cobrimento de 3cm, estribo de 5,0mm e armadura inicial estimada em 20,0mm, resultando numa altura útil d de 55,5cm. Considerar que o concreto a ser utilizado no elemento seja de Fck = 30MPa.

viga-t-dimensionamento

PARÂMETROS

αc = 0,85

Fcd = 𝐹𝑐𝑘/𝛾𝑐;30/1,4=21,43𝑀𝑃𝑎

σcd =αc×Fcd=0,85 ×21,43=18,2MPa ≅1,82kN/cm²

Fyd=𝐹𝑦𝑘/𝛾𝑠; 50/1,15 =43,48𝑘𝑁/𝑐𝑚²

λ=0,8

βf=ℎ𝑓/𝑑= 12/55,5=0,216

βw=𝑏𝑤/𝑏𝑓= 25/115=0,217

ξlim=0,45

se βf > λ×ξlim;Viga de seção retangular,de largura 𝑏𝑓 e altura útil 𝑑. 𝜆 ×𝜉𝑙𝑖𝑚=0,8×0,45=0,36

Portanto, como o valor é maior que βf, portanto seguimos o dimensionamento de viga de seção T.

MOMENTO REDUZIDO E MOMENTO LIMITE

Iremos majorar o momento positivo encontrado no diagrama pelo coeficiente de 1,4, e multiplicar por 100, para convertermos o momento de kN.m para kN.cm.

μ=𝑀𝑑/(𝑏𝑓×𝑑2×σcd)= (50,6×1,4×100)/(115×55,5²×1,82)=0,01099

Para determinar o valor μlim, que determina o momento fletor máximo resistido pela seção comprimida de concreto sem a necessidade de armadura adicional, usaremos as tabelas de Araújo (2014) referentes ao caso. Por ser Fck<35MPa, βf = 0,216 (em azul), βw = 0,217 (em vermelho), a tabela selecionada é a seguinte:

tabela-valores-bf-dimensionamento-viga-t

Para refinar os resultados, pode-se utilizar de interpolação linear para obter um resultado mais preciso:

valores-bf

Obtendo um valor de μlim=0,2177, observamos que ele representa que nossa seção comprimida resiste ao momento fletor solicitante (μ<μlim), não necessitando assim de armadura para compressão.

DIMENSIONAMENTO DE VIGA PARA ARMADURA SIMPLES

𝜇𝑓=𝛽𝑓(1−0,5𝛽𝑓)=0,216∗(1−0,5∗0,216)=0,1927

𝑆𝑒 𝜇≤𝜇𝑓=> 𝜔=1−√1−2𝜇;0,01099 ≤0,192

0,01099≤0,1927

𝜔=1−√1−2∗0,01099=0,011

𝐴𝑠=𝜔×𝑏𝑓×𝑑×σcd/𝑓𝑦𝑑=0,011∗115∗55,5∗(1,82/43,48)=2,95𝑐𝑚²

Para dimensionar as armaduras nos locais de momento fletor negativo e os estribos para resistir ao esforço cortante, deve-se considerar a seção retangular de 25×60. Esforços cortantes abaixo.

portico-dimensionamento-viga-t

DIMENSIONAMENTO DE VIGA À CORTANTE E ARMADURA DE COSTURA

CORTANTE

Utilizando-se do gráfico acima, vamos determinar a armadura necessária para combater o esforço cortante transversal na nervura da seção a seguir:

dimensionamento-viga

𝜏𝑤𝑑=𝑉𝑑/𝑏𝑤𝑑= (67,5∗1,4)/(25∗55,5)=0,0681𝑘𝑁/𝑐𝑚2 𝑜𝑢 0,68𝑀𝑃𝑎

𝜏𝑤𝑢=0,27𝛼𝑣𝑓𝑐𝑑 onde 𝑎𝑣=1−𝑓𝑐𝑘/250=1−30/250=0,88

𝜏𝑤𝑢=0,27∗0,88∗(30/1,4)= 5,09𝑀𝑃𝑎

Este valor representa a capacidade resistente da biela de compressão, portanto a condição 𝜏𝑤𝑑≤𝜏𝑤𝑢 precisa ser verificada para dar continuidade ao cálculo.

A contribuição da resistência ao cisalhamento do concreto é dada pela fórmula 𝜏𝑐 = 0,09(𝑓𝑐𝑘)^2/3

𝜏𝑐 = 0,09(30)^2/3 = 0,869𝑀𝑃𝑎

E a tensão cisalhante de cálculo é dada por 𝜏𝑑 = 1,11(𝜏𝑤𝑑−𝜏𝑐) ≥ 0

𝜏𝑑 = 1,11(0,68−0,869) = −0,21𝑀𝑃𝑎

Como a tensão de cálculo ficou negativa (menor que zero), significa que a seção de concreto já bastaria para resistir ao cisalhamento, porém, há a necessidade de ser empregada uma armadura mínima, dada pela fórmula e tabela a seguir:

𝐴𝑠𝑤,𝑚𝑖𝑛=𝜌𝑤,𝑚𝑖𝑛100𝑏𝑤, cm²/m (estribos verticais)

armadura-mínima

Portanto: 𝐴𝑠𝑤,𝑚𝑖𝑛=0,12%∗100∗25= 3𝑐𝑚²/𝑚

ARMADURA DE COSTURA

DIMENSIONAMENTO-ARMADURA-COSTURA

A fórmula empregada para a determinação da armadura de costura necessária é dada por 𝐴𝑠𝑓 = 100∗𝑏𝑤∗𝐴1/𝐴∗𝜏𝑑/𝑓𝑦𝑑 em cm²/m onde 𝜏𝑑 = 1,11∗𝜏𝑤𝑑

Resolvendo com os dados obtidos anteriormente, temos:

 𝜏𝑑 = 1,11∗0,068 = 0,0755 𝑘𝑁/𝑐𝑚²

O valor de A1 é dado por b1*hf, portanto 45*12=540cm² Enquanto a área total A é de 2580cm².

Portanto 𝐴𝑠𝑓 = 100∗25∗(540/2580)∗(0,0755/43,48) = 0,91 𝑐𝑚²/𝑚

A NBR6118 exige uma área mínima de 1,5 cm²/m, portanto este valor seria o adotado.

Neste artigo vimos a definição de vigas seção T, algumas considerações inciais de dimensionamento e acompanhamos o dimensionamento completo na pratica de uma viga seção T. Caso tenha se interessado pelo assunto se inscreva no meu canal, para acompanhar conteúdos de engenharia de estruturas, clicando aqui!

Texto por Eduardo Depiné Tarnowski

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